4 de set. de 2008

La Mano de Dios - Morre Waldick Soriano

Que apazigue as dores de corno em outra existência, ó Mestre!

Pois é, meus amigos, que futebol que nada, hoje abro este espaço para divulgar uma triste notícia. O Grande Waldick se foi, deixando nós, amantes das mulheres e cornos em potencial um pouco mais tristes do que de costume.

Como homenagem, reproduzo abaixo o texto do colossal Xico Sá, meu guru de cana e de pena. Pensando bem, a tristeza de um amante solitário tem muito a ver com futebol sim...

VOCÊ NÃO É CACHORRO NÃO, MAS EU SOU WALDICK SIM, COM MUITO ORGULHO

Morreu, digo, partiu desta para uma melhor, o cantor e compositor Waldick Soriano, o nosso Johnny Cash baiano, como diz o escriba e amigo Zé Teles. A imagem que fica é o seu chapéu preto voando em uma noite fria de São Paulo, mas precisamente na porta do cabaré do viejo Charles Bronson, ali na rua Avanhandava. Foi a última vez que estive com o ídolo, finalzinho do ano passado. Inesquecível a conversa molhada por duplos uiscões inspiradores. Nós, cuja educação sentimental, aí incluindo os bons pares de chifres, devemos a WS, o homenageamos com esta crônica que segue, e que a terra e todas as dores de amores lhe s sejam leves... No cinquentário da bossa-nova, sinto muito pelos bons modos jazzisticos que tanto agradaram a classe média do sr. João Gilberto, mas ninguém me disse mais coisas do que esse homem que cantava Dostoievski para as putas e para as nossas mães ao mesmo tempo:


“Hoje que a noite está calma/ E que minha alma esperava por ti/Apareceste afinal/ Torturando este ser que te adora...”


Cuba libre e uma canção de Waldick Soriano, quem há de resistir?


Quem há de se meter a bacana e não deixar irromper das profundas e sinceras cacimbas d´alma a cafonice de nascença? Brega não, cafona sim, hoje e siempre.


Lembro minha mãe Maria Socorro e a prima Maria Ivone, nuestra amada e bolerística Marivone, o buriti-mor da generosidade do Crato e arredores, ouvindo Waldick e Nelson –“Fica comigo esta noite/que não te arrependerás/ lá fora o frio é um açoite...”

E o primeiro porre? Sullivan, Adailton, Garrincha...O elenco. O meu foi no Caldas, Barbalha, também nas áreas dos Kariris, antes mesmo de conhecer os escribas Wilson Vieira e Josélio Aráujo, amigos do ramo e daquela terra, barcos que navegam com a verve da cachaça e do lirismo -de que mais pode ser feito um homem de verdade a não ser com essas duas argamassas?


Sem essa de brega-cult, modinha de machos & fêmeas, imperava a cafonália mesmo,e a trilha sonora do primeiro porre não poderia ser mais bela: Bartô Galeno,claro. “No toca-fita do meu carro, uma canção me fez lembrar você".


Mas voltemos a Waldick, toque outra vez meu amigo, talvez não haja canção mais bela, sim, do que “Tortura de Amor”, aquela cujos versos enfeitam a cumeeira desse texto,e que prossegue, mais ou menos assim: “Volta, fica comigo só mais uma noite/Quero viver junto a ti/Volta, meu amor/Fica comigo, não me despreza/A noite é nossa e o meu amor pertence a ti”.


Chora, Evaldo Costa, lembra do tempo em que nos consolávamos com a radiola do Robertão 70, clássico do romantismo dos derredores do Parque 13 de Maio, no glorioso Recife? Pelo que sabemos, eis que o destino levou Robertão, e não por morte morrida, por morte matada, um covarde faca que arranca as tripas de um homem como o neo-realismo vira o sol das existências. Robertão,sósia do rei, era mesmo um greco-pernambucano, a tragédia dormia debaixo dos caracóis dos seus cabelos.


Toca outra vez, Waldick: “Hoje eu quero paz,/Quero ternura em nossa vida/Quero viver, por toda vida,/ pensando em ti”.


Falar no homem, essa mesma “Tortura de amor”, com o grupo português Clã, é uma coisa d´além mar. Pense numa dor-de-corno com acento de fado e melancolia à moda do Porto! A homenagem a Waldick está no cd “Eu não sou cachorro, mesmo”, da Allegro Discos, a mesma gravadora que havia feito um tributo a Odair, esse outro monstro do chifre. Além da mocinha do Clã se derramando de amor & dor, tem China e Lula Queiroga cantando Marcio Greyck, que eu vou te contar, uma coisa de cinema, uns curiós, uns pitiguaris, umas patativas, uns sabiás...

Toca outra vez, Waldick, desce mais uma, Robertão 70, e que vocês se entendam por ai... Daqui do planeta azul, platonicamente hablando e tirando onda de sofista em tubarônicas bocarras, pago la dolorosa... Depois de todas as saideiras a gente se reencontra. Beijos.


Xico Sá (http://carapuceiro.zip.net/)

2 comentários:

João Paulo Tozo disse...

"A imagem que fica é o seu chapéu preto voando em uma noite fria de São Paulo, mas precisamente na porta do cabaré do viejo Charles Bronson, ali na rua Avanhandava. Foi a última vez que estive com o ídolo, finalzinho do ano passado. Inesquecível a conversa molhada por duplos uiscões inspiradores."

Imagina um momento desse, num cenário desse, com um acompanhemento desse e principalmente, uma companhia dessa.

Sinto uma inveja de pessoas com vivências desse tipo. Não que não tenhamos as nossas, memoráveis tbm, mas existe um glamour inserido nesse contexto todo que eu não consigo definir, mas que me faz querer vive-lo. Não só esse descrito de forma fantástica pelo Xico, mas quantos tenham sido os deles, os de outros e dos que estão por vir, boêmios dessa vida sem eira.

Valorizo os meus momentos, puta queo pariu! Quero um dia recordar de todos e ter momentos para descrever como o Xico descreveu esse com WS. Talvez não com a classe dele, mas ao meu modo.

Um Uiscaço duplo e on the rocks para ambos.

Fábio B. A. disse...

Hoje haverá brindes em homenagem ao grande Waldick, que foi cantar as dores de um romântico solitário em outras paragens...

Todos os bares, cabarés e bordéis choram a perda desse que talvez seja um dos poucos que entendeu verdadeiramente a miséria de amar e não ser correspondido!