A noite em que voltei mais cedo para casa pra ver um jogo do Ronaldo

Entendo que para aqueles que ainda estão na casa dos 20 o Ronaldo seja um fenômeno. Suas façanhas, especialmente vestindo a camisa da seleção, são notórias. Pessoalmente não cheguei a ser fã de seu futebol. Lembro—me de quando ele surgiu, desajeitado, ostentando a linda camisa celeste do Cruzeiro. Invariavelmente saiam artigos no jornal comentando o jogador que tinha “média de gols maior que a do Pelé”.

Em sua primeira Copa Ronaldo passou todo o tempo no banco. Até o Viola disputou a final contra a Itália, mas nada de vê-lo nas quatro linhas. Acho que a imagem mais marcante que temos dele em 94 é a da foto, o garoto com jeito serelepe estirado frente aos heróis do tão aguardado tetra.

Após a Copa dos EUA Ronaldo mudou-se para a Europa e, possivelmente, foi nosso primeiro grande craque a fazer toda sua carreira no exterior. Tinha mais imagens de Ronaldo como garoto propaganda do que de um atleta. Dele me reaproximava somente nas partidas pela seleção brasileira.

Acho que a primeira vez que tive uma certa noção da relevância dele foi, justamente, uma dia em que ele se ausentou. Falo, obviamente, da final da Copa da França. Recordo-me do estardalhaço em torno de sua não-escalação momentos antes do jogo, dele entrando em campo contradizendo a burocracia das papeletas entregues à imprensa e, claro, lembro-me do saco que levamos dos Bleus naquela partida.

Depois Ronaldo voltou para a Europa e, curiosamente, quase todas as lembranças que tenho dele, a exceção de suas participações na seleção, dizem respeito a eventos extra-futebolisticos. Seu casamento no Castelo, namoradas, noitadas, travestis e campanhas publicitárias. Ah, sim, a participação nos Galáticos do Real Madrid, que sempre me pareceu mais uma constelação de jogadores-pop-stars do que, porpriamente, um time de futebol.

Pois bem, Ronaldo voltou ao país e havia fortes indicações que ele jogaria pelo Flamengo. Eu, talvez um romântico da bola, não via o menor sentido na contratação. Seria um bom marketing? Essa frase sempre me soa estranha. Como Flamenguista eu quero um bom título, não um bom marketing. Talvez seja um pensamento a curto prazo, mas, enfim... quando o Corinthians o contratou fiquei aliviado.

Bem, contra a minha própria expectativa, ontem me vi apressado para chegar em casa e ver a estréia do “Fenômeno” (detesto esse apelido) com o uniforme alvi-negro. Assisti o primeiro tempo – e como o jogo estava ruim fui fazer outras coisas – deixei a TV ligada esperando que fosse anunciada sua entrada em campo. Assisti os vinte e poucos minutos que ele disputou da partida, acho que, na esperança de poder, enfim, formular uma opinião acerca da efetiva grandeza dele como jogador. Sim, jogo de seleção não conta muito: na seleção um flamenguista é capaz de torcer sinceramente pelo maior ídolo do Vasco da Gama. Se a volta do Ronaldo para o Brasil tem algum significado para mim, acredito, é este.