23 de jun. de 2009

La Mano de Dios - Agora que a poeira está baixando...

Agora que a poeira está baixando...

Depois de três dias, a demissão de Muricy parece já ter sido digerida. É a hora de pensar mais calmamente e ver as coisas sem as nuvens da emoção deixando as coisas um tanto obscuras. Muita abobrinha foi dita nesses três dias, mas também foram escritos belos textos, menos emotivos e mais inteligentes. Destaco aqui o melhor dos que li. A parte em negrito é destaque meu.

Muricy, o vizinho do 74
por José Trajano, especial para o ESPN.com.br

Somos vizinhos há mais de dez anos. E raramente nos vemos no condomínio. Moramos em prédios diferentes, e jamais fora a seu apartamento. Nossos filhos, porém, são amigos. Jogam bola e participam de torneios de videogame no salão de festas. Na noite de sexta-feira, o vizinho do 74 era o nome mais falado da cidade. Todos os telejornais e sites divulgavam com alarde que ele havia sido demitido do emprego. Um emprego e tanto! E, então, decidi visitá-lo.

Resolvi interfonar para não usar a prerrogativa de ser vizinho. Ele não estava, mas deixei recado com sua mulher que se chegasse e estivesse disposto a conversar, me telefonasse. Poucos minutos depois, ele ligou e pediu que fosse até lá. No caminho, fiquei pensando que deveria estar cercado de gente, de amigos, ex-companheiros de clube ou coisa parecida. Qual não foi a minha surpresa quando me recebeu com a porta já aberta e sozinho na sala.

Ao contrário do que imaginava, estava tranquilo e sereno. Sem nenhuma ponta de mágoa, rancor, bronca. Parecia ter tirado um peso das costas. Seu rosto revelava a certeza de que havia saído de cabeça erguida e com a sensação do dever cumprido. Fora o momento que se queixou de Cuca, por ter ligado ao presidente Juvenal para pedir conselho se deveria sair ou continuar no Flamengo, atitude que ele enxergou como falta de ética, o vizinho conversou sobre tudo com muita tranquilidade.

Para ele, a diretoria anda mais preocupada com o Morumbi do que com o time. Os cartolas só pensam no estádio, na Copa do Mundo de 2014, e os problemas do time ficaram em segundo plano. E havia problemas no elenco. Falta de parceria, disse. Que eu entendi como ciumeira de alguns jogadores com os novos que chegaram este ano.

Sem levantar a voz ou tentar se desculpar pelos maus resultados, o vizinho lamentou não ter conseguido Conca como reforço. “Ele esteve duas vezes aqui, mas o negócio não vingou”, disse. Um bom meia de ligação teria feito o time jogar diferente, com mais liga entre a defesa e o ataque, sem precisar jogar à base de lançamentos longos para o setor ofensivo.

O vizinho desconfiava que, mais cedo ou mais tarde, a demissão iria acontecer, porque ele não tem o jeitão que alguns dirigentes imaginam para um técnico do São Paulo. Não é de frequentar bons restaurantes para fazer companhia aos cartolas, não gosta de interferências na contratação de reforços e acredita até que a maneira de se vestir deixava essa turma incomodada. “É o meu jeito, simples, sem frescura, sem afetação, que as vezes eles não gostam.”

Toquei na decisão que tomamos em não mais ouvi-lo depois de uma entrevista que achei grosseira . Ele disse que não guardou mágoa e que somos meio parecidos na defesa de quem trabalha com a gente. Até os filhos brincaram com ele, achando que andava meio rabugento.

Já era de madrugada quando fui embora. Um pouquinho antes de sair, chegaram Pi e Fabinho, dois de seus três filhos. O vizinho me contou que o Pi (sou testemunha que joga muita bola) voltou muito irritado do Morumbi depois da derrota para o Cruzeiro e prometeu não torcer mais pelo São Paulo. O vizinho discordou do filho e disse que não podia abrir mão de sua paixão, que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Voltei para casa com a impressão de que meu vizinho é mesmo aquilo que diz. Gosta de ficar em casa, em companhia da família, dos cachorrinhos que leva sempre para passear, de lavar louça para passar a ansiedade e de ir ao sítio em Ibiúna para descansar. É um cara simples, um trabalhador do esporte. Sem banca, sem arrogância, não tem nada de “professor”.

Ele sabe que foi a derrota da arquibancada para a numerada. Mas sabe também que saiu por cima. A torcida gritou seu nome a todo instante, e isso ele não esquecerá nunca. Quer dar uma parada, já jogou no lixo tempos atrás uma proposta milionária do Catar, mas não creio que fique parado por muito tempo. Continuo achando que precisa ter mais educação nas entrevistas, após uma partida, mas me conquistou pela sinceridade e autenticidade.

É um bom sujeito o vizinho do 74. Boa sorte para ele.

5 comentários:

JPTB disse...

Não sou lá grande fã do Trajano. Mas dessa vez tiro meu chapéu para a destreza com que tratou do assunto. Sem estardalhaço, falou com o objeto de toda a discussão e com ele tocou nos pontos que todos os que tentam abordar do assunto com isenção, tocam.

Boicote ao Washington, que pelo que o Muricy disse não era só direcionado ao Washington. O quase abandono do futebol por parte da diretoria para buscar realizar o sonho da Copa. Entre outros.

Mas sobretudo na questão da derrota da "arquibancada para a numerada". A arquibancada queria o cara de conduta firme, mas estilo simples de vida. É a parte da torcida que não deixa a soberba tomar conta de sua ótica futebolística. Enquanto a galera da "numerada" prefere o cara que pisa devagar, que discute sem erguer o tom da voz. É a galerinha que infelizmente (para o torcedor tricolor) dá a margem necessária para que os rivais construam sua caricaturização do torcedor são paulino.

Rene Crema disse...

O Luxa é a cara do São Paulo então,rs ..

pode levar !!!

Fábio B. A. disse...

Infelizmente, e não só para o São Paulo, a parte da torcida que é tema na mídia é a minoria barulhenta.

No Palmeiras é a Turma do Amendoim, no Corinthians são os bandidos disfarçados de torcedores, no São Paulo é a elite soberba, e por aí vai...

Rene Crema disse...

é a democracia no futebol, se um tem , todos tem que ter ... queda pra segundona tb ta incluso viu, rs

Fábio B. A. disse...

Rene, o corvo, hahahahhahaa!